sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Xipat Oboré (Tudo de Bom!)







Mundurukar é:
Contemplar o tempo que passa pequeno.
Sentir a brisa do vento que acaricia o espírito.
Solfejar as notas harmônicas do universo.
Sentir o coração da deusa pulsar e acompanhar o doce movimento da vida que teima em sobreviver.
Harmonizar o Crer e o Compreender num mesmo espaço em conflito.
Descobrir o novo a cada dia.
Saber dizer o belo a quem se que quer bem.
Saber dizer o belo a quem não se quer tão bem.
Saber dizer Amém, Aleluia, sim e não.
Saber Ser
Saber-se SER.



Texto de Daniel Munduruku 
www.institutouka.blogspot.com  
www.danielmunduruku.blogspot.com

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Povoar a solidão





Permita que sua solidão seja bem aproveitada, que ela não seja inútil. Não a cultive como uma doença, e sim como uma circunstância

A sua é de que tamanho? Difícil encontrar alguém que tenha uma solidão pequena, ajustada, do tipo baby look. Geralmente, a solidão é larga, esgarçada, como uma camiseta que poderia vestir outros corpos além do nosso. E costuma ser com outros corpos que se tenta combatê-la, mas combatê-la por quê?

Se nossa solidão pudesse ser visualizada, ela seria um vasto campo abandonado, um estádio de futebol numa segunda-feira de manhã. Dói, mas tem poesia. Talvez seja por aí que devamos reavaliá-la: no reconhecimento do que há de belo na sua amplitude.

A solidão não precisa ser aniquilada, ela só precisa de um sentido. Eu não saberia dizer que outra coisa mais benéfica há para isso do que livros. Uma biblioteca com mil volumes é um exército que não combate a solidão, mas a ela se alia.

A solidão costuma ser tratada como algo deslocado da realidade, como um tumor que invade um órgão vital. Ah, se todos os tumores pudessem ser curados com amigos. Uma pessoa que não fez amigos não teve pela sua vida nenhum respeito. Nossa solidão é nossa casa e necessita abrir horários de visita, hospedar, convidar para o almoço, cozinhar com afeto, revelar-se uma solidão anfitriã, que gosta de ouvir as histórias das solidões dos outros, já que todos possuem seus descampados.

A solidão não precisa se valer apenas do monólogo. Pode aprender a dialogar e deve exercitar isso também através da arte. Há sempre uma conversa silenciosa entre o ator no palco e o sujeito no escuro da platéia, entre o pintor em seu ateliê e o visitante do museu, entre o escritor e o seu leitor desconhecido. Ah, os livros, de novo. De todos os que preenchem nossa solidão, são os livros os mais anárquicos, os mais instigantes. Leia, e seu silêncio ganhará voz.

Às vezes, tratamos nosso isolamento com certa afetação. Acendemos um cigarro na penumbra da sala, botamos um disco dilacerante e aguardamos pelas lágrimas. Já fizemos essa cena num final de domingo - tem dia mais solitário? É comum que a gente entre na fantasia de que nossa solidão daria um filme noir, mas sem esquecer que ela continuará conosco amanhã e depois de amanhã, deixando de ser charmosa e nos acompanhando até o supermercado. Suporte-a com bom humor ou com mau humor, mas não a despreze.

Permita que sua solidão seja bem aproveitada, que ela não seja inútil. Não a cultive como uma doença, e sim como uma circunstância. Em vez de tentar expulsá-la, habite-a com espiritualidade, estética, memória, inspiração, percepções. Não será menos solidão, apenas uma solidão mais povoada. Quem não sabe povoar sua solidão, também não saberá ficar sozinho em meio a uma multidão, escreveu Baudelaire.

Ah, os livros, outra vez.

Martha Medeiros

domingo, 23 de dezembro de 2012

A descoberta do amor



       “[...] Quando criança, e depois adolescente, fui precoce em muitas coisas. Em sentir um ambiente, por exemplo, em apreender a atmosfera íntima de uma pessoa. Por outro lado, longe de precoce, estava em incrível atraso em relação a outras coisas importantes. Continuo, aliás, atrasada em muitos terrenos. Nada posso fazer: parece que há em mim um lado infantil que não cresce jamais.
Até mais que treze anos, por exemplo, eu estava em atraso quanto ao que os americanos chamam de fatos da vida. Essa expressão se refere à relação profunda de amor entre um homem e uma mulher, da qual nascem os filhos. [...] Depois, com o decorrer de mais tempo, em vez de me sentir escandalizada pelo modo como uma mulher e um homem se unem, passei a achar esse modo de uma grande perfeição. E também de grande delicadeza. Já então eu me transformara numa mocinha alta, pensativa, rebelde, tudo misturado a bastante selvageria e muita timidez.
       Antes de me reconciliar com o processo da vida, no entanto, sofri muito, o que poderia ter sido evitado se um adulto responsável se tivesse encarregado de me contar como era o amor. [...] Porque o mais surpreendente é que, mesmo depois de saber de tudo, o mistério continuou intacto. Embora eu saiba que de uma planta brota uma flor, continuo surpreendida com os caminhos secretos da natureza. E se continuo até hoje com pudor não é porque ache vergonhoso, é por pudor apenas feminino.
Pois juro que a vida é bonita.”

Clarice Lispector

domingo, 4 de novembro de 2012

NÃO GOSTO DO TEU SILÊNCIO





Não gosto do teu silêncio introspectivo, calado, porque entre a palavra e os teus lábios, vivem talvez as minhas angústias.
Não te gosto assim, só, retirante, superior, porque assim parece que vives preocupado com as coisas que te rodeiam, e eu não me sinto uma delas.
É no teu olhar de preto profundo, que vejo dois estranhos pássaros noturnos e, o teu lindo olhar, apenas reflete a beleza das estrelas.
Não te gosto em silêncio meditativo, porque assim, ficas distante de mim, como se fora um combate íntimo entre a manhã e a tarde prenunciando o indeciso crepúsculo.
No teu silêncio introspectivo, parece que vives com alguém escondido em teu olhar e que ainda te fascina.
Não te gosto em silêncio, porque nesta profundeza não consigo saber, se me queres, e o teu silêncio constante martiriza e me deixa insegura, pois o amor que penso nutrir por ti se inibe, retraindo-se.
Nada deves a alguém, nem tão pouco a mim que te quero tanto – porque o teu silêncio?
Tenho te escrito poemas, baladas, simples acrósticos, de certa forma, instigando-te a romperes esta barreira, quase intransponível do teu silêncio.
Preciso da tua palavra cheia de afeto e carinho e ao mesmo tempo forte como o vento de verão, que arrasta as nuvens e o horizonte levando as folhas secas de outono, descobrindo-te ao sol para mim.
Rompe o teu silêncio e diga que me quer.
Aí sim, faremos silêncio nós dois e a quatro lábios falaremos a linguagem universal do amor.
Apenas os nossos lábios falarão e sentirei o teu hálito a se misturar com o meu, numa profusão de eternas carícias.
Teu silêncio talvez seja sábio, mas me intranquiliza  chego a imaginar que apenas me aceitas e isto evidencia “tolerâncias”, não as quero.
Se romperes o teu silêncio, amar-te-ei para sempre, voltarei a escrever poemas, baladas, canções somente para ti.
Endeusar-te-ei!
E quando estiver longe de ti, somente para ti comporei.
Um beijo em silêncio.

Eráclito Alírio

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O contrário do Amor



Vamos falar sobre indiferença. Qual é o tipo que te amedronta? Vai ai algumas opções:

1. Aquela que a pessoa que você ama não lembra que você existe.
2. Aquela que a pessoa que você ama, não ama você.
3. Aquela que a pessoa que você ama lembra que você existe, mas não dá a mínima pros seus sentimentos.
4.  Aquela que a pessoa que você ama lembra que você existe, finge que dá importância pros seus sentimentos, mas age com você da pior maneira possível.

De todas as opções, você pode escolher 1,2 ou todas. Garanto, é possível viver todos esses tipos de indiferença amando apenas uma pessoa. A partir do momento que ela não se importa com seus sentimentos ela está sendo indiferente a você. Mesmo que diga o contrário.

O contrário do Amor

O contrário de bonito é feio, de rico é pobre, de preto é branco, isso se aprende antes de entrar na escola. Se você fizer uma enquete entre as crianças, ouvirá também que o contrário do amor é o ódio. Elas estão erradas. Faça uma enquete entre adultos e descubra a resposta certa: o contrário do amor não é o ódio, é a indiferença.

O que seria preferível, que a pessoa que você ama passasse a lhe odiar, ou que lhe fosse totalmente indiferente? Que perdesse o sono imaginando maneiras de fazer você se dar mal ou que dormisse feito um anjo a noite inteira, esquecido por completo da sua existência? O ódio é também uma maneira de se estar com alguém. Já a indiferença não aceita declarações ou reclamações: seu nome não consta mais do cadastro.

Para odiar alguém, precisamos reconhecer que esse alguém existe e que nos provoca sensações, por piores que sejam. Para odiar alguém, precisamos de um coração, ainda que frio, e raciocínio, ainda que doente. Para odiar alguém gastamos energia, neurônios e tempo. Odiar nos dá fios brancos no cabelo, rugas pela face e angústia no peito. Para odiar, necessitamos do objeto do ódio, necessitamos dele nem que seja para dedicar-lhe nosso rancor, nossa ira, nossa pouca sabedoria para entendê-lo e pouco humor para aturá-lo. O ódio se tivesse uma cor, seria vermelho, tal qual a cor do amor.

Já para sermos indiferentes a alguém, precisamos do quê? De coisa alguma. A pessoa em questão pode saltar de bung-jump, assistir aula de fraque, ganhar um Oscar ou uma prisão perpétua, estamos nem aí. Não julgamos seus atos, não observamos seus modos, não testemunhamos sua existência. Ela não nos exige olhos, boca, coração, cérebro: nosso corpo ignora sua presença, e muito menos se dá conta de sua ausência. Não temos o número do telefone das pessoas para quem não ligamos. A indiferença se tivesse uma cor, seria cor da água, cor do ar, cor de nada.

Uma criança nunca experimentou essa sensação: ou ela é muito amada, ou criticada pelo que apronta. Uma criança está sempre em uma das pontas da gangorra, adoração ou queixas, mas nunca é ignorada. Só bem mais tarde, quando necessitar de uma atenção que não seja materna ou paterna, é que descobrirá que o amor e o ódio habitam o mesmo universo, enquanto que a indiferença é um exílio no deserto.

O contrário do amor não é o ódio e sim a indiferença. 

Concordo,
Martha Medeiros.